Qual o impacto da meta de recuperação de pastagens degradadas do Plano ABC+ no Brasil?
Aumento do PIB brasileiro, ampliação da renda e do consumo, redução nas emissões de gases de efeito estufa e controle do desmatamento. Esses resultados dão dimensão do impacto que a recuperação de pastagens degradadas (RPD) e em degradação, no âmbito do Plano ABC+, pode trazer para o Brasil até 2030.
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30 milhões de hectares de pastagens degradadas. Esse é o tamanho da área que o Plano ABC+ (Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura 2020-2030) pretende recuperar até 2030 no Brasil. O TEEBAgriFood, por meio de uma parceria entre o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e o Grupo de Políticas Públicas da Esalq/USP, buscou entender o impacto dessa política, considerando as interações entre sociedade, economia e natureza. Para isso, avaliou dois cenários até 2030: um com adoção de tecnologias convencionais para RPD e outro que, além da RPD convencional, adota em parte da área a integração lavoura-pecuária (iLP). Ambos os cenários foram comparados a uma linha de base – ou business as usual (BAU) – isto é, uma projeção que considera a não aplicação da política.
Trazemos a seguir os principais dados do estudo e convidamos você a se aprofundar nos conteúdos e navegar pelos mapas interativos, clicando ao lado.
Como medir o impacto?
O desafio metodológico desse projeto foi gerar informações que permitissem indicar como os capitais (natural, humano, social e produtivo) se transformam diante da recuperação de pastagens degradadas no Brasil e quais os impactos gerados por essas mudanças. A solução foi atuar em quatro frentes (Modelagem EGC, Modelagem Espacial, Modelagem Biofísica e Análise Multicriterial) a partir de uma análise espacial abrangente de diferentes cenários futuros para discutir os impactos econômicos, sociais e ambientais da recuperação de 30 milhões de hectares de pastagens degradadas, meta do Plano ABC+ até 2030.
Qual o tamanho da área degradada?
Ao todo, são 102,8 milhões de hectares de pastagem degradadas no Brasil (incluindo pastagens com degradação intermediária ou severa, segundo classificação do LAPIG, de 2020). Para termos noção, a área corresponde a pouco mais de 8% do território nacional: é uma extensa área de pastos com poucos nutrientes ou erodidos, com tamanho superior ao Chile e Uruguai somados. Ou ainda: é quatro vezes o tamanho do estado de São Paulo. As pastagens degradadas estão concentradas principalmente (51,3%) nos estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Bahia.
Área degradada por tamanho de propriedade rural e região
Comparação entre a área degradada e potencialmente recuperada
Distribuição das áreas a serem recuperadas com RPD e RPD+iLP
As regiões analisadas
Considerando o modelo de equilíbrio geral utilizado (TERM-BR), o Brasil foi dividido em 14 regiões de simulação, conforme o mapa abaixo.
Cenário 1
RPD
Recuperação de pastagens degradadas é um processo direto de recuperação de pastagens por meio de diferentes práticas, como a melhoria da cobertura do solo e da qualidade das plantas forrageiras com técnicas de manejo e fertilização, ou o completo restabelecimento de uma área através de revolvimento do solo, correção química e semeadura.
Qualidade da pastagem
Classes de degradação de pastagem (2020)
Cenário 2
RPD+iLP
Integração lavoura-pecuária é uma forma indireta de recuperação de pastagens que alterna a própria pastagem com culturas temporárias, como milho ou soja. Neste cenário, a iLP foi considerada como estratégia de recuperação de pastagens em parte da área a ser recuperada. A distribuição das culturas agrícolas usadas na iLP foi feita com base na sua participação regional.
Sistema Lavoura-pecuária
Alocação Geográfica
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Resultados econômicos
O volume de investimento
de R$13 bilhões
e o custeio de R$131 bilhões (Plano ABC+) gerariam:
R$165 bilhões
de aumento acumulado (com RPD)
R$202 bilhões
de aumento acumulado (com RPD+iLP)
*Todos os valores estão corrigidos para 2023
PIB cresce em todas as regiões
Estados em que a pecuária tem maior participação se destacam. Economias menos desenvolvidas apresentariam maior crescimento no PIB real.
Agregados Macroeconômicos |
Percentual acumulada RPD |
Percentual acumulada RPD+iLP |
---|---|---|
PIB real ? | 1,30 | 1,62 |
Salário real ? | 2,20 | 2,77 |
Índice de preço dos alimentos ? | -2,35 | -2,56 |
Consumo das famílias ? | -1,82 | -2,21 |
Investimento real ? | 3,78 | 4,61 |
Exportações (volume) ? | -3,01 | -2,87 |
Importações (volume) ? | 3,76 | 5,12 |
Mudança percentual nas exportações Brasileiras acumuladas até o ano de 2030 |
Cenário 1 RPD |
Cenário 2 RPD+iLP |
---|---|---|
Milho em grão ? | 0,9 | 1,6 |
Soja em grão ? | 1,3 | 31,5 |
Carnes ? | 38,2 | 35,3 |
Resultados ambientais
Conservação de vegetação nativa
O crescimento da produtividade da pecuária bovina ampliaria a produção, reduzindo o preço dos produtos e impactando a rentabilidade do setor. Isso levaria a uma redução da demanda por áreas de pastagem em relação à linha de base, evitando desmatamento da vegetação nativa que ocorreria sem a aplicação da política e ampliando a área agrícola e as florestas plantadas. A RDP mostrou que tem potencial de promover um efeito “poupa-terra” em torno de 6,2 milhões de hectares em nível nacional. Esse efeito é ampliado no caso da RPD+iLP, podendo chegar a 7,2 milhões de hectares. Em alguns estados, porém, poderia haver “efeito-rebote”, em que o aumento da produtividade da pecuária estimularia o desmatamento. Vale ressaltar que os efeitos aqui descritos são sempre em relação à linha de base (business as usual – BAU). Portanto, em todos os cenários haverá desmatamento até 2030, mas nos cenários RPD e RPD + iLP esse desmatamento será menor do que na linha de base. Deslize o mapa abaixo para comparar.
LINHA DE BASE x CENÁRIO 1 - RPD
LINHA DE BASE x CENÁRIO 2 - RPD+iLP
Linha de base
Uso | Área (Mha) |
---|---|
Vegetação nativa | 508,4 |
Agricultura | 108,9 |
Pastagem (total) | 176,9 |
Total | 794,2 |
Cenário 1 - RPD
Uso | Área (Mha) |
---|---|
Vegetação nativa | 514,6 |
Agricultura | 107,8 |
Pastagem (total) | 171,8 |
Total | 794,2 |
CENÁRIO 2 - RPD+iLP
Uso | Área (Mha) |
---|---|
Vegetação nativa | 515,6 |
Agricultura | 107,9 |
Pastagem (total) | 170,7 |
Total | 794,2 |
Sequestro de carbono
É importante destacar que a fixação de carbono no solo e em pastagens de boa qualidade seria é capaz de compensar o aumento das emissões provocado pelo crescimento da pecuária.
Percentual - CO2 equivalente
Pecuária de corte |
Pecuária de Leite |
Total | |||
---|---|---|---|---|---|
Emissões totais | 38,4 | 14,5 | 9,9 | ||
Emissões totais (com C no solo) | -1,04 | -1,59 | -1,3 | ||
Intensidade de emissões | -0,42 | -0,68 | - | ||
Intensidade de emissões (com C no solo) | -28,78 | -14,60 | - | ||
38,9
Incremento de produção |
15,2
Incremento de produção |
Erosão do solo
Ambos os cenários (RPD e RPD+iLP) contribuiriam para a redução das taxas de erosão dos solos. De modo geral, as reduções médias de perda do solo para o território brasileiro seriam de 2,26% para o cenário de RPD e 1,94% para o cenário de RPD+iLP. Isso porque o arranjo temporal da integração lavoura-pecuária pode comprometer parcialmente a capacidade de proteção do solo quando a agricultura se torna presente no local.
Manutenção de Habitats
Habitats naturais fornecem importantes serviços ecossistêmicos e permitem a conservação da biodiversidade. Para avaliar a manutenção desses espaços, foram medidos, além da área de cobertura de vegetação nativa, parâmetros como o tamanho dos fragmentos com capacidade de conservação da biodiversidade, a área núcleo dos fragmentos e a conectividade funcional dos mesmos. No geral, nos dois cenários (RPD e RPD+iLP), haveria, em relação à linha de base, aumento da área de cobertura vegetal nativa, inclusive nos estados com os maiores rebanhos bovinos. No entanto, na maioria dos estados não haveria melhoria nos demais indicadores, resultando em evolução quantitativa, mas não qualitativa para a manutenção dos habitats. Por isso, políticas públicas complementares poderiam ser implementados visando restaurar a vegetação nativa, garantir a conectividade funcional entre os remanescentes (corredores ecológicos) e a manutenção de suas áreas nucleares (diminuindo os efeitos de borda).
Equipe técnica GPP/ESALQ/USP
- Joaquim Bento de Souza Ferreira F.
- Alberto G. O. P. Barretto
- Adauto B. Rocha Jr.
- Arthur N. Fendrich
- Evandro H. Silva
- Felipe Miranda
- Giovani William Gianetti
- João Gabriel Ribeiro Giovanelli
- Marina Yamaoka
- Marcela Almeida de Araujo
- Marluce da Cruz Scarabello
- Pedro A. Quilici Coutinho
- Pietro Gragnolati Fernandes
- Rodrigo de Almeida Nobre
- Rodrigo F. Maule
- Sergio Paganini Martins
- Simone B. Lima Ranieri
- Stoécio Malta F. Maia
Resultados sociais-humanos
Preços menores, salários maiores, mais consumo
A maior disponibilidade de produtos da pecuária bovina ocasionaria uma redução dos preços. Com o aumento da atividade econômica, haveria uma ampliação do salário real das famílias, especialmente para a mão de obra mais qualificada.
Considerando somente o consumo de alimentos, ele aumentaria para todas as famílias. Entretanto, as famílias mais pobres teriam uma pequena redução no consumo geral. Na classe de trabalhadores mais pobres (POF1) haveria redução do consumo real nas regiões AM-AC-RR, PA-AP, PI-BA, MA-TO, Restante do Nordeste e MG. Para GO-DF isso ocorreria apenas no Cenário de RPD. Por isso, o estudo alerta para a necessidade de se implementar políticas públicas complementares para proporcionar ganhos a essas famílias.
Consumo geral das famílias
Preços
Consumo de alimentos das famílias
Variação dos salários